7 de mayo de 2015
Nesta última sexta-feira, 30 de abril de 2015, o Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA, promoveu o Encontro dos Guardiões de Semente Crioulas no município de São Miguel do Oeste, extremo-oeste de Santa Catarina. O evento reuniu mais de 30 guardiões, homens e mulheres, que na oportunidade trouxeram amostras das sementes que estão mantendo, ou melhor, optaram por guardar para as futuras gerações, somando mais de 55 variedades, das espécies de milho, feijão, trigo, arroz epipoca, além de espécies de adubos verde e hortaliças.
O evento que reuniu camponeses do estado, também trouxe os professores da Universidades Federal de Santa Catarina – UFSC, Rubens Nodari e Paulo Lovato, porém, quem protagonizou o encontro foram os camponeses. Para começar, partiu-se de uma apresentação, pois a maior parte destes guardiões ainda não se conheciam. Cada qual, além de se apresentar, também expôs as sementes que estão cuidando, bem como, suas características sem deixar de dizer o porquê se tornaram guardiões de sementes crioulas.
Ao se apresentar o camponês de Anchieta, TercelinoGofi, fez questão de ressaltar, «sempre gostei de preservar essas sementes crioulas», afirma com sabedoria do camponês do MPA. Da mesma forma como Adolfo Seger, camponês do município de Princesa, «a gente quer viver na roça, a gente não quer sair da roça», revelando o desejo de muitos dos camponeses presentes. Seguidos pelo professor, RubensNodari, que atualmente coordena o Programa de Pós-graduação em Recursos Genéticos Vegetais da UFSC, «eu falo para osmeus alunos, que nós temos um Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação, como se só os institutos de pesquisa, ou as universidades possam fazer inovação, eu digo para os meus alunos que, quem mais faz inovação são os agricultores, e as vezes eles não acreditam, porque a maior inovação da humanidade foi feita pelos agricultores, que é a domesticação das espécies, o domínio e melhoramento genético», explica o professor.
Ainda pela manhã criou-se uma linha do tempo, na qual foi marcadaos fatos históricos e as experiências de produção e conservação das sementes crioulas. A partir dessa metodologia,foi possível identificar qual o período de maior diversidade e quandopassou-se a dar mais valor estas sementes. Sendo assim, a amostra mais antiga está sendo mantida desde 1915 é uma variedade de tomate, identificado por Tomate Rosa, semente vinda do Sementário da Dona Salete. Outro fato interessante que a linha do tempo nos revelou é que até meados de 1975 e 1980, poucas espécies de sementes eram mantidas, indicador esse que está relacionado ao êxodo rural, a liberação das sementes geneticamente modificadas (transgênicas) e o uso massivo de venenos. Passando a intensificar, com maior ênfase, o resgate e a multiplicação a partir de 1995 e 2000, momento em que várias organizações sociais passaram a realizar atividades de regate, conservação e multiplicação das sementes crioulas junto com os agricultores, como é o caso do MPA.
O dirigente do MPA, Gilberto Afonso Schneider afirma que um dos motivadores dele estar no MPA foi pelo trabalho com as sementes, sua família ainda conserva algumas variedades e principalmente sua Soberania Alimentar. Gilberto destaca que,»com o surgimento do MPA no Estado o trabalho com as sementes crioulas foi intensificado, até chegar na experiência que hoje é a Unidade de Beneficiamento de Semente do MPA em São Miguel do Oeste». Ele lembra ainda que, «hoje os agricultores continuam cuidando das variedades, inclusive as cultivadas antes do surgimento do MPA», recorda Gilberto.
O dirigente do MPA lembra ainda que, «nossa experiência é reconhecida nacionalmente e internacionalmente, onde realizamos vários processos de cooperação internacional com a Venezuela, Moçambique (África), Paraguai e Argentina», destaca ele. A opção pelo resgate, conservação e multiplicação de sementes crioulas, buscando a Soberania Alimentar e Genética dos camponeses, «trouxe aresponsabilidade que o MPA tempela Via Campesina Internacional, de coordenar o Coletivo de Agroecologia, Sementes e Biodiversidade, com a temática das sementes e a campanha (Sementes: Patrimônio dos Povo a Serviços da Humanidade) da Via Campesina, que é o resultado desse trabalho quefazemos no dia a dia», lembra o dirigente do MPA.
A construção da Soberania Alimentar e Genética dos camponeses passa pelas sementes, por esta razão é que elas se tornaram alvo de disputas pelo agronegócio. Como lembra o camponês e militante do MPA, Gilmar Campanha, «muito em breve essas sementes crioulas irão ter o seu devido valor reconhecido, porque a Agricultura Camponesa nunca vai ser extinta por mais que a agricultura de larga escala e monocultura está se alastrando, mas ela nunca vai ter essa diversidade de produção que nós fizemos», reforça o camponês.
Para a camponesa de Romelândia, Fátima Maia Bikel, a importância das sementes crioulas está no seu potencial nutricional. «Eu passo para os meus filhos, meus pais não guardaram isso, mas eu gosto disso, gosto desse trabalho, acho maravilhoso e gosto de passar para as pessoas, falar para elas e mostrar que a gente pode criar e produzir desde o frango até a última semente que vai na panela», comenta a camponesa, que ainda destaca, «fiquei muito contente com esse encontro, pois a gente guarda essa semente a bastante anos, então é muito gratificante para mim», complementa Fátima.
A família e Dona Fátima tem cultivado a variedade de Milho Maia há 80 anos, como explica a camponesa, «essa semente vem da família do meu esposo, que trouxeram do Rio Grande do Sul e quando eles partiram, nós continuamos produzindo e vamos continuar a produzir também, esse milho Maia é originário do México, estudando pelos Índios Maia, mas o nomeoriginal dele é Zeca Maia», conta entusiasmada a camponesa que traz em seu nome, o nome do milho o qual cultiva como herança de família.
Durante a avaliação das atividades do dia, destacou-se a importância que os guardiões têm, a troca de experiências, as novas ações que o grupo irá se dedicar e, a construção constante do resgate, conservação e multiplicação das sementes crioulas na construção da Soberania Alimentar e Genética dos Camponeses. Assim como, com o objetivo de fortalecer o trabalho desenvolvido pelos guardiões de sementes crioulas, o MPA por meio da Cooperativa Oestebio lançou o desfaio aos guardiões de multiplicar suas sementes, para distribuir às 1.400 famílias que são beneficiadas pelo Projeto ATERAgroecologia (Projeto de Assistência Técnica e Extensão Rural em Agroecológica). Estas sementes serão adquiridas pela cooperativa do MPA e disponibilizadas de forma gratuita as famílias camponesas como contrapartida no projeto de ATER, da mesma forma que é importante destaca, a Oestebio mantém uma parceria com a UFSC para o fortalecimento das condições de produção e oferta de sementes de milho para a produção orgânica e agroecológica do Sul do Brasil.
Desafios que a linha do tempo construída pelos participantes ainda demonstra, mas também, deixa evidente que o Campesinato tem se mantido como classe, apesar das mudanças que o campo tem passado, como afirma Gilberto, «nós não podemos conservar as sementes só porque elas são bonitas, mas sim, porque elas são uma estratégia para a construção de um novo modelo de agricultura», finaliza o dirigente do MPA.